quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

DESAPEGAR-SE ( ou Dia de Faxina)



 
Eu hoje joguei tanta coisa fora
Eu vi o meu passado passar por mim
Cartas e fotografias gente que foi embora
A casa fica bem melhor assim” (Paralamas do Sucesso)

Esta semana eu ouvia no carro a 'nova versão' desta música dos Paralamas, na voz do Herbert (agora solo), e comecei a pensar sobre isso. A letra diz tudo, principalmente este começo.
De vez em quando faço faxina nos meus guardados. Adoro organizar as coisas (minhas e alheias) e reciclar. Gosto de separar o 'joio do trigo', de peneirar, de triar. Gosto de dar uma nova roupagem para aquilo que esteve por tanto tempo guardado. Mudo coisas de lugar, crio espaços, abro caminhos. Talvez seja esse o real sentido da 'arrumação', talvez seja uma arrumação interna, organização interna, que canalizamos materialmente. Ao mesmo tempo, é interessante perceber como as coisas perdem o significado que tinham num primeiro momento. Por exemplo, guardamos um ticket de show a que fomos com alguém especial, ou foi uma noite especial, um show especial e aquilo nos remete aquele momento e não conseguimos jogar fora. Passado o tempo, quando fazemos a tal faxina, olhamos para aquilo e pensamos: aquele momento está registrado para sempre na minha memória. Para que eu estou guardando esse papel velho há tanto tempo? E nos desapegamos. E nos desfazemos. O papel tinha uma memória afetiva para nós, mas com o tempo, com nossas novas percepções do que é realmente especial, de quem realmente é especial, aquilo perde o sentido. Há também coisas que nem sabemos por que guardamos e estão lá, atravacando nossa vida, nosso espaço. Essa triagem do que realmente é importante para nós, deveria ser feita frequentemente, constantemente. Não só com objetos, mas com conceitos, sentimentos, percepções. Tenho um método de descarte: quando uma coisa não foi usada ou 'acessada' por muito tempo, cerca de 1 ano ou 2, de um inverno ou verão (ou dois), não é tão necessária assim. 'Ah, mas eu posso precisar'. Se precisar, arrumo outro. Como até agora não precisei, é pouco provável que precise no futuro.
Dá uma sensação de dever cumprido, de alívio, essa triagem. Parece que quando juntamos uma sacola de coisas que serão descartadas, aquilo realmente foi tirado de nossas costas, um peso que se vai. Talvez por que ao decidirmos o que vai e o que fica, façamos uma catarse, uma limpeza emocional. Lembramos de passagens de nossa vida, de pessoas, de momentos e, como diz a música “...eu vi o meu passado passar por mim...”Sorrimos, gargalhamos, lágrimas escorrem, nos enternecemos, tudo simultaneamente.
As vezes, essa limpeza é de papéis que nos sentimos rídiculos por ainda guardar, como comprovante de compras de 5 anos atrás, de gasolina, de um calzone....
Outras vezes são roupas. Olhamos para aquela roupa que deixamos de usar por deixar de servir ou por já não estar nas melhores condições, mas não temos coragem de nos desfazer por que atribuímos a ela situações especiais. Ou então por que nos favorecia visualmente. Ou por que gostávamos da textura, da cor. Aí, olhamos com outros olhos para aquela roupa agora, neste momento, e pensamos: eu sei que não vou mais usar isso. Por que guardar? As vezes nos enchemos de zelos por aquele pedacinho de pano e pensamos: será que quem receber essa roupa, que vou doar, vai dar o mesmo (e talvez o devido) valor? Será que vai ter cuidado na hora de lavar, de usar, de guardar? Ou vai transformar aquela roupa, que guardamos por tanto tempo por significar algo para nós, em um 'pano velho', com total descaso pela sua conservação?
Mas aí, nos imbuímos do desprendimento necessário (e que só surgiu naquele momento) e, com coragem, reconhecemos que isso já não importa mais. Que aquilo é só um pedaço de pano, um objeto. Tem memória afetiva, uma atribuição, um significado, que só nós demos a ela, mas que dali pra frente escolhemos nos desprender daquele momento e, consequentemente, daquele objeto representativo.
Fim de ano é o momento ideal para essas faxinas (físicas e emocionais), por que sempre temos esperança de que o ano novo traga coisas novas, sentidos novos, lembranças novas. E que tudo deve mudar apenas por que passamos de um dia para o outro, de um mês para o outro, como fazemos todos os meses, mas que naquele 31 de dezembro adquire novo significado, novo simbolismo, de mudança mesmo.
Isso deveria ser feito mês a mês, durante todo o ano, mas como nem sempre é possível, nada melhor do que escolher um mês, uma data, que simbolize essa mudança, essa renovação. Por que ano novo significa renovar, começar outra vez, nova oportunidade.
E a vida é feita de ciclos e os ciclos se renovam.
Comece um 2012 livre dessas amarras, do velho, do desnecessário.
RENOVE-SE !

CRÔNICA POSTADA EM 02.12.2011

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