sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

INFÂNCIA ANOS 70


No domingo passado, à tarde, meus pais saíram pra comprar uma cama. Fiquei lembrando do tempo que em que era criança e que minha mãe saía aos sábados pela manhã pra ir ao supermercado. Se ela não fosse no sábado, único dia livre, e pela manhã, não compraria mais, por que os estabelecimentos fechavam, impreterivelmente ao meio dia.
De uns tempos pra cá, não me lembro bem de quando começou, muitas lojas e estabelecimentos comerciais passaram a abrir nos fins de semana, o dia inteiro, e hoje já temos até os 24 horas.
Aí, comecei a lembrar de muitas coisas da infância e de como tudo mudou, naturalmente. “É pra frente que se anda!”
Bem, nem sei se tudo mudou pra melhor, mas mudou.
Quando tinha uns 5/6 anos tomava o refrigerante Crush. Era sabor laranja e vinha numa garrafa de vidro (como todas daquela época). O que mais me encantava nem era o refrigerante em si, mas a garrafa! Ela tinha detalhes em alto relevo, principalmente umas bolinhas na parte de cima, próxima do gargalo, que lhe davam uma certa aspereza. Gostava de deslizar os dedos pelos entalhes e sentir as diferenças: mais liso em baixo, mais áspero na parte de cima.
Lembro de ir buscar leite na ‘venda’ e ele vir em saquinhos e de como era gelado carregar aquilo. Me disseram que ainda existe leite em saquinhos, mas nunca mais vi, apenas na caixinha tetra pak.
Lembro também de carroças passando pela minha rua vendendo pão ou peixe. Certa vez, bem em frente de minha casa, minha mãe e outras vizinhas estavam comprando peixe, eu acho, e uma criança, num descuido da mãe, foi pra debaixo da carroça. Um dos filhos da vizinha, de uns 16 anos, mais ou menos, foi tentar retirá-la de lá e foi mordido pelo cavalo, no ombro. Fiquei muito impressionada, nem tanto com o que aconteceu, mas como os adultos reagiram, fazendo muito alarde, e até hoje isso ficou na minha memória.
Engraçado de que quando se é criança as coisas ficam tão impressas na mente da gente, né? Às vezes coisas bobas, mas que tiveram um significado emocional maior e, por isso, o registro. A gente lembra de sons, cores, sabores...
É comum vermos pessoas mais idosas lembrando de sua infância e do quanto seus olhos ficam distantes, do quanto se emociona. Dá vontade de restituir-lhes tudo aquilo de volta, mas sabemos que o tempo não pára, como dizia Cazuza.
Lembro de estar com meu irmão Alexandre e um bando de meninos, amigos dele (eu a única menina), num pé de jabuticabas. Eles subiam e apanhavam as frutas e traziam na barra da camiseta pra mim, que aguardava com uma bacia, embaixo, pacientemente, ora apontando aqui e ali. De 
irmos todos (eu e eles) num pequeno regato perto de casa pegar piavas (aquele peixinho pequeno e tão irrequieto).
Andávamos de bicicleta, meu irmão Alexandre brincava de bolinha de gude ou descia ladeiras em carrinho de rolimã. Eu gostava de brincar de teatro, inventava roteiros e improvisava figurino. Naturalmente, eu dirigia...
Alexandre também tinha um forte apache que ganhou da madrinha. Passava horas com aqueles soldadinhos e os índios, brincando. Não existia vídeo game, nem computador. As brincadeiras eram todas ao ar livre. Não conseguíamos tomar o café com pão,sentados à mesa. Sempre tomávamos o café rapidamente e saíamos ainda comendo o pão, pra não perder tempo na hora de brincar. Minha mãe não se conformava com isso.
Eu e Alexandre gostávamos de fazer experiências, só pra ver no que daria e ‘roubávamos’ da cozinha tudo que encontrávamos na dispensa: um pouquinho de arroz, macarrão, vinagre... Já na rua, misturávamos tudo e, esperançosos, esperávamos até o outro dia só pra descobrir que aquilo tinha virado um grude duro.
Aos 7 anos, eu gostava de fingir que era francesa. Não sei de onde tirei isso, mas colocava um lápis no canto da boca, segurava bem na pontinha e fingia ser uma piteira. Pra completar, colocava um lenço da minha mãe, à guisa de echarpe, bem esvoaçante, e...voilà! Estava uma francesa legítima!
Também falávamos em ‘inglês’. Claro que num idioma totalmente incompreensível em qualquer parte do mundo! (cá entre nós: tudo inventado...)
Meu irmão usava cabelo estilo pagem, um corte muito na moda daquela época. Quando entrou no primário, aos 7 anos, no inverno minha mãe o vestiu com o tradicional poncho. Era um poncho azul, de lã e muito comum no Rio Grande do Sul. Mas, em Santa Catarina, menino vestindo poncho era sinal de ser maricas e riam muito dele. Alexandre chorava muito diante dos coleguinhas, humilhado por causa do deboche, e não queria mais ir pra escola vestido daquele jeito. Aliás, esta história de as mães escolherem as roupas dos filhos sempre foi um problema, não?
Durante muito tempo odiei a cor vermelha, apenas por que ela me vestiu assim durante toda a infância e eu nunca gostei muito desta cor. Na fase adulta fiz as pazes com o vermelho e hoje já posso usar.
Também lembro de ter uns 6 anos e ver umas casinhas, perto da minha casa, no bairro Barreiros (depois soube se tratar do atual Bela Vista I). Todas eram iguais, brancas, uma ao lado da outra, num morro todo gramado. Aquilo me impressionava e perguntava pra minha mãe por que elas eram assim. Ela invariavelmente me dava uma resposta bem simplista: “são as casinhas do governo”.
Eu provavelmente não me convencia com esta explicação, não entendia, e queria detalhes e 
ela ficava repetindo a mesma coisa. Passava mais uns dias e eu tornava a perguntar, ela se irritava e acrescentava que "eram as pessoas que não podiam comprar uma casa e o governo dava pra elas"...Uns 10 anos depois disso, eu fui trabalhar na tal empresa que constrói as casinhas (mas fiquei sabendo que eles não dão, tá? Eles vendem!), onde estou até hoje, 25 anos depois. Coincidências da vida...
Falar de infância é muito gostoso, a gente realmente volta no tempo pra descrever, mas as emoções são sentidas diferentemente daquela época, por que agora compreendemos tudo melhor e podemos racionalizar.
De qualquer modo, é igualmente divertido.
Deixo o convite pra viajares pra tua infância! Agora!

CRÔNICA POSTADA EM 2011

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