quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

SUBMISSÃO



Gosto de assistir ao seriado Os Pioneiros, uma série antiga dos anos 70. Num episódio, a Laura, uma adolescente, cerca de uns 15 anos, mais ou menos, acho, recebe uma proposta de trabalho como professora noutra cidade. O namorado não aceita que ela vá e nem é por que ela irá pra longe, mas porque não quer que ela trabalhe. Na visão machista desse 'pioneiro', ele é o provedor do lar. Ela alega que, se trabalhar, eles poderão se casar mais rápido, pois será um salário a mais, mas ele não quer conversa e ela se resigna e joga a carta admissional fora. A carta fica jogada na estrada de chão, enquanto a carroça se afasta, de forma emblemática e significativa.
Assistindo esta cena, a feminista que existe dentro de mim, de forma nada enrustida, aflorou, ou melhor, gritou!
Podemos justificar que a série é dos anos 70 e que reflete a realidade de uma era ainda mais distante, dos anos 1800. Alguns podem argumentar que hoje é tudo diferente, etc e tal, mas não é. Infelizmente não é. A mulher já conquistou muitas coisas, mas ainda está longe de ser tão independente quando pretende. E parte dessa culpa é dela.
Conheço fartos exemplos de mulheres que ao casarem, ou mesmo ainda no namoro, passam a viver a vida do marido. Se afastam de amigos, da família e vivem apenas ao redor daquele 'provedor' (mesmo que, na verdade, seja ela a real provedora). Quando esse marido/namorado vai embora ou mesmo morre, ela fica perdida. Descobre, subitamente, no que transformou sua vida. Ser um satélite, sempre na órbita de quem realmente era o centro do seu Universo: ele.
Esse ele pauta todas as conversas. No tempo dele as coisas eram diferentes, ele gostava disso ou daquilo, quando ele estava aqui eu fazia isso ou aquilo e por aí vai...
Muitas culpam o parceiro por serem do jeito que são. “Não faço isso por que meu marido/namorado não quer, não gosta, não deixa.”
Compreendo que numa relação, principalmente a amorosa, ambos precisem ceder, precisem reafirmar seu amor através de pequenos gestos, pequenas concordâncias. Mas isso é sintomático quando a pessoa passa a ceder constantemente, passa a perder suas referências.
Quando isso acontece, muitas vezes é visto como 'papel de mulher', mas na realidade mostra uma personalidade dependente e com baixa autoestima. Faz isso, principalmente, por que quer agradar e não perder o parceiro, mas acontece quase sempre o contrario, por que o outro perde o respeito por alguém que não tem vontade ou opinião próprias. Uma coisa é ceder de vez em quando pra evitar conflitos desnecessários. Outra, bem diferente, é não ter vida própria, não ter amigos, interesses, muitas vezes evitar contato com pessoas que sejam amigas ou familiares, mudar de roupa por que o outro criticou ou vetou, não fazer nada que o parceiro não aprove, não ter iniciativa pra se divertir e só fazer aquilo que ele decidir.
Parece longe da nossa realidade? Não. Não está. É até bem próxima. Conheço, como disse, vários casos. E me arrepio só ao ter conhecimento, imagine estar nesta situação.
Uma relação, para sobreviver, não precisa só de amor, nem de demonstrações constantes e fartas disso. Precisa de um sem número de outras coisas, mas uma delas, e a principal, é a pessoa não perder seu referencial e continuar sendo aquela que o parceiro conheceu.
É tão triste presenciar quando a pessoa se dá conta disso e, geralmente acontece, depiois que a realção acaba. Aí, corre atrás do prejuízo, mas aqueles amigos de antes não vão ter interesse nessa pessoa que só agora se volta deles por que precisa. Ela não cultivou esses amigos, não fez novos, não teve nenhum interesse fora da relação, só quis fazer coisas que incluíssem o parceiro e, agora, se percebe, so-zi-nha. É triste.
E quantas pessoas vão de relação em relação fazendo isso?E não refletem, não aprendem. Culpam o outro, mas é ela a culpada. Por se deixar depender.
Num outro episódio daquele seriado, Os Pioneiros, a mesma Laura (que vive uma história veridica, baseada em fatos reais ocorridos com a escritora do livro que deu origem a série), depois que o namorado perde toda a colheita por causa de um evento climático, diz que vai aceitar o emprego na outra cidade. Ele veta a intenção dela, diz que ela não vai e ela questiona, se impõe, argumenta. Por fim, ela diz que já decidiu e que vai, pois do contrário eles nunca se casarão. Não vi o fim desse imbróglio, mas imagino que a vontade dela prevaleceu. Embora assistindo sozinha, vibrei e aplaudi secretamente. Não se trata de uma disputa de poder, mas de usar o bom senso. A ignorância e o orgulho nunca foram bons conselheiros.
Aí, essas mesmas mulheres que sempre cedem aos desejos e vontades caprichosas de seus companheiros dizem que 'às vezes' os 'enfrentam', não cedem, ' batem o pé '. O que isso quer dizer exatamente?
Acredito que as pessoas devam preservar seus relacionamentos, mas não consigo assistir passivamente a essa falta de amor-próprio. O 'amor pelo outro' é a desculpa perfeita pra se anularem. Isso não é amor. Isso é dependência.

CRÔNICA POSTADA EM 13.05.2011

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