segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

O CORPO


Quando percebi, tinha engordado muito. Mas muito MESMO.
E agora?!
Bom, é simples: fazer dieta! Mas nem tudo é tão simples quanto parece. Fazer a dieta nem sempre é fácil mesmo, mas e quando ela não dá resultados?
O pior de engordar nem é a gordura em si, a deformação do corpo, dos traços. O pior de engordar são os outros. Sim, eu quis dizer isso mesmo: os outros.
Era interessante perceber que, como se já não bastasse ter que me adaptar ao novo corpo, as pessoas que me encontravam, amigos, conhecidos, faziam questão de me contar que eu tinha engordado. Como se eu nem tivesse percebido!
Talvez elas estivessem apenas surpresas, mas conversavam comigo meio aflitas pra logo abordar o assunto.
A pessoa que engorda não pode comer em público, por que quem olha logo deduz que ela é um triturador humano, comendo sem parar. Aconteceu comigo algumas vezes. Eu não almoçara, estava apenas com um parco café da manhã e fui fazer um lanche, um simples misto quente, acho, às três horas da tarde. Logo vinha alguém, geralmente um homem indelicado, e me alertava: é por isso que tu engordas...

A gente vai vendo o corpo se transformar e, com assombro, descobre que aquela blusa meio larguinha simplesmente não entra mais! Parece que encolheu! Ou fui eu que cresci?
E, como num dominó sádico, parecendo o plano terrível de alguém, uma a uma as roupas vão deixando de servir. As bijuterias também. Como que um dia eu iria imaginar que um anel não entraria mais no meu dedo! Aliás, vários deles. Calçados idem. Bota, nem pensar (ainda bem que eu nem gosto mesmo)!
De repente a gente imagina que irá sair pelada pelas ruas, por que encontrar roupa pro novo corpitcho é outro problema. E, o que encontra, é muito sem graça, parecendo que somente pessoas idosas ou senhoras cheias de filhos, engordam. Fora o olhar de compaixão de uma vendedora mais compreensiva quando, depois de provar meio estoque da loja, nada ficou bom. Sim, por que também tem aquelas que dizem que não tem o nosso número, “querida”, e que será dificil encontrar. Previsão certeira. Simplesmente não há. Antigamente eu vestia GG, mas isso mudou. Agora temos o G1, G2, G3, G4 e até o G5! Credo! Parece os andares do estacionamento de um shopping! Será que foi daí que tiraram a inspiração?

As lojas especializadas usam termos como “tamanhos nobres”, “tamanhos grandes” (acho que é pra abrandar um pouco o estigma).
Afora todo esse problema com roupas, ainda tem o mau estar físico. De um momento para o outro, uma caminhadinha de 10 minutos parece uma maratona. Subir em qualquer coisa, como ladeiras, escadas e afins, se torna quase digno de uma medalha!
Mas há uma explicação pra isso. Além de a pessoa ter que carregar todo aquele peso, ainda tem uma pressão sobre o diafragma, que por sua vez comprime o pulmão. Aí falta o ar e a pessoa se cansa facilmente.
Ninguém engorda só por fora. A gordura envolve e se infiltra pelos órgãos principais. E isso é perigoso.
As pessoas se preocupam somente com o estético, com o corpo em forma, mas não se atentam que a gordura é perigosa no sentido de prejudicar a saúde também. Muitas doenças tem sua origem na obesidade e outras a obesidade complica. Ou seja: não é bom ser gordo.

Gordos, principalmente os novatos, não gostam de falar o peso, nem subir em balanças públicas, como as de farmácia. Por que? Por causa das críticas, ironias e deboches. Vira alvo de piada, como todos os 'diferentes'. Ninguém que ser motivo de comentários maldosos. Já vi gordinhos e gordões, principalmente homens, terem que ouvir piadinhas e comparações grosseiras. E sorrir! Nesse momento me entristeço, por que imagino o que aquela pessoa deve estar sentindo. As pessoas podem ser muito cruéis. Mesmo quando nem se apercebem disso.
Quando se engorda, atos simples como cortar as unhas dos pés, se abaixar pra pegar algo, levantar de uma cadeira de praia, se tornam muito dificeis, por que a gordura impede a flexibilidade. Há aqueles que não tem esse problema, mas uma grande maioria tem, sim.
Pra quem não foi gordo a vida toda, é um mundo completamente novo e estranho. Chega a ser engraçado, de tão bizarro.
Dizem que a obesidade é uma doença e acredito nisso. Quem tem tendência a engordar, precisa controlar o peso a vida toda. Há aqueles que fazem loucuras pra emagrecer, tomam remédios, fazem dietas malucas, qualquer coisa pra ser magro. Qualquer coisa!
A cirurgia bariátrica, que antes era uma medida extrema, foi banalizada. As pessoas não percebem que é uma cirurgia e de grande risco. Soube de uma moça, que se formou com meu irmão André e, depois da formatura, resolveu fazer a tal cirurgia e...morreu!
Uma outra (essa me contaram), quando saiu do hospital, ainda no pós-cirurgia, entou num boteco e comeu uma coxinha. Foi o que bastou. Morreu também.
Quantos morrem assim. Há aqueles que ficam ótimos e que somente a cirurgia resolveria mesmo, mas a maioria tem cabeça de gordo, gosta de comer e tem dificuldades pra se adaptar. “Driblam” as recomendações de ingerir apenas líquidos, por exemplo, nos primeiros meses, e 'mamam' leite condensado! Parece que estão se boicotando. A entrevista com um psicólogo é de praxe, até pra pessoa entender o processo e desfazer a fantasia do milagre. Mas também pra ser avaliada de forma séria, afim de saber se ela tem condições de viver todo o processo, de compreender o que vai realmente acontecer, da mudança radical de hábitos e de vida.

Estou fazendo tratamento com uma gastro e uma nutricionista há 5 meses. O motivo principal foi uma série de problemas gástricos. No entanto, a obesidade complicava outros. Houve mudança de hábitos alimentares, reposição nutricional através de suplementos e a consciência de que precisava fazer alguma coisa, pois meu corpo estava em colapso. Por causa dos problemas gástricos cada vez me alimentava de forma pior ou não me alimentava e com isso houve uma defasagem de nutrientes, complicando ainda mais o quadro.
No primeiro mês estranhei muito, pois além da mudança de hábitos alimentares, mudaram também os horários. Se antes passava quase o dia inteiro sem comer, agora comia a cada 2 ou 3 horas. Foi um choque pro metabolismo. Tinha muita sede também.
Quando me pesei na nutricionista foi com grande surpresa que vi meu peso despencar em 5 quilos já neste primeiro mês. O maior ganho, no entanto, foi a saúde. Não tinha mais nenhum dos sintomas, ou se tinha, era muito pouco. No segundo mês, mais 5 quilos e meio e as pessoas começaram a notar. Era engraçado vê-las me olhando, olhando, sem saber direito se estavam enxergando direito. Aí, começaram a me contar novamente a novidade, mas desta vez que eu estava emagrecendo. Da última vez que me pesei já se tinham ido 14 quilos!
Agora dei uma estacionada, mas sei que é normal. Nas poucas vezes que furei a dieta, senti literalmente no estômago os efeitos, muita dor, por que este era um dos sintomas antes.
Em relação à melhora, foi geral, não apenas no aspecto físico, os traços que foram ressurgindo, mas também na 'leveza'. Caminho sem sentir cansaço ou dor na coluna. Me abaixo sem problemas, tudo fica mais flexível e fácil. As roupas estão despencando ( e outras coisas também).
Tudo novamente vira novidade, mas desta vez pra melhor.
É interessante que até o tratamento das pessoas muda. Elas ficam mais gentis, atenciosas.
Ao contrário do que pensam as pessoas em geral, os problemas de peso nunca afetaram minha auto-estima. Talvez por que não tenha crescido como uma pessoa gorda, mas me tornei. Isso faz toda a diferença, por que a auto imagem já tinha sido construída.
O excesso de peso traz inconvenientes, claro, mas o que me faz lembrar desta fase é o preconceito das pessoas. Às vezes a gente está se aceitando assim, sente que é uma fase e que como tal, irá passar. Mas os outros não. A cobrança alheia vem o tempo todo, seja através de olhares velados ou explícitos, seja através de palavras ferinas ou piedosas, compreensivas.
Quantas vezes precisei calar, pensando: “Perdoa, Pai. Eles não sabem o que dizem! “
Quantas vezes abri e fechei a boca, numa perplexidade muda, por não acreditar no que estava ouvindo, em como as pessoas são sem noção.
Aceitar o outro como ele é demanda uma alma generosíssima, sensibilíssima e muito madura.
Emagrecer está sendo um lucro, no fim das contas, não um objetivo.
Está sendo o bônus, o plus, a cerejinha do bolo ( ôps! bolo não pode. Bolo engorda).
Nunca duvidei de que isso aconteceria, embora muitas vezes tenha me exasperado com a demora em achar o caminho. Era um problema que tinha solução e que seria resolvido em algum momento, mesmo que eu não soubesse quando.
Fotos, como as roupas, nunca foram exatamente um problema. Sempre dei um jeito de resolver. As fotos podem ficar legais se soubermos achar um ângulo favorável. Tem gente que foge das câmeras, mas nunca foi meu caso, por que vou testando, buscando soluções. As roupas já eram um problema um pouco mais sério, mas a gente sempre acha alguma coisa, vai se adaptando, garimpando aqui e ali. Sou do tipo que procura disfarçar o que não favorece, abusa de acessórios, nunca descuida do batom, do perfume. Tudo tem jeito!
Nada disso é em função do outro, da aceitação alheia, mas do prazer em estar bem, mesmo na adversidade. Não estou exatamente no meu melhor momento (em todos os sentidos), mas acredito firmemente, que sou mais forte do que tudo isso, do que a aparência. Não dependo dela (felizmente) apenas. Ela conta, sem dúvida! Mas não resume quem eu sou e minha força interior, meu potencial.
O corpo é nossa embalagem, um cartão de visitas. Mas não representa quem somos de verdade. A essência, pra mim, conta muito mais do que a aparência, que é efêmera. É triste uma pessoa não perceber que envelheceu e querer manter a juventude a qualquer custo. Ou engordar e achar que é menos digna ou interessante.
Acho que deve haver harmonia e bem estar com o próprio corpo, mas isso deve ser a própria pessoa que decide, que almeja, que busca. Ela é quem deve saber como quer seu corpo, não os outros. É o julgamento alheio que faz as pessoas não se aceitarem.
Se ela se aceita, como é, o julgamento alheio incomoda, mas não ao ponto de ela ficar arrasada por isso, se auto desvalorizando.
O que me impressiona é o quanto as pessoas, em geral, querem decidir a vida do outro. Posso ter minha opinião sobre isso ou aquilo, mas não posso e não devo querer que o outro siga os meus padrões.
Se alguém se queixa pra mim sobre sua aparência, posso tentar ajudá-lo, mas nunca me oferecer pra fazer isso por que acho que é o que o outro quer.
Hoje sinto que meu corpo, minha aparência, independente do peso, estão mudando, envelhecendo. Percebi isso há bastante tempo, mas não me incomodo. Lamento que não possamos ficar do jeito que queremos pra sempre, no auge, mas sem dramas. Tudo tem seu tempo e precisamos aceitar isso.
Por isso, cuide de si (mais do que do outro) e seja feliz com o que tem, todos os dias.

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