quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

DO TEMPO QUE SE AMARRAVA CACHORRO COM LINGUIÇA !


“Atesto para os devidos fins que o senhor fulano de tal, 2º sargento do exército, servindo na circunscrição do serviço militar, é pessoa de meu conhecimento, servindo sob minha chefia e que o mesmo é possuidor de ' bom comportamento '. Abril de 1972.”

Este texto acima, encontrei dentro de um contrato, no meu trabalho. O contrato é para aquisição da casa própria e é natural que se peçam referências, mas o que acho engraçado é que o 'chefe', o superior hieráquico deste militar, foi quem deu o 'Atestado de Boa Conduta'. Nos casos em que a pessoa era autônoma, um delegado era quem expedia o 'nada consta'.
Acho muito 'suspeito' o chefe dizer que o militar, o funcionário, é uma boa pessoa, etc.
Vamos ver se consigo me fazer entender. O que quero dizer é que apesar de ser natural pedir referências antes de vender algo a alguém nessa época, 1972, e acho que dali 'para trasmente' (como dizia Odorico Paraguassu) também sempre foi assim, é que as pessoas 'tinham palavra'. Meus pais são dessa época, em que a pessoa deveria ser honesta, íntegra e, se se comprometesse com algo, tinha que cumprir, não importa o que custasse. Os deveres eram levados muito a sério. Meu pai costuma repetir que houve uma época em que a pessoa 'empenhava o fio do bigode', querendo com isso dizer que a pessoa tinha se comprometido e, por isso, não havia do que se desconfiar, o que temer, só a palavra bastava.
Então, lendo o tal de atestado de boa conduta, embora compreendesse as razões, principalmente as da época, achei engraçado por que me parece uma coisa tão arcaica o chefe dizer que ele assegurava que aquele militar era 'boa pessoa', então se poderia vender a casa pra ele. É como se a palavra dele fosse tudo! Como se ele se auto-valorizasse demais! É claro que com isso ele estava se comprometendo, falando em nome do funcionário, atestando que não haveria problemas em vender e, se houvesse, ele seria responsabilizado, mas para nós ele não era ninguém!
Outro dia, estava assistindo a Os Pioneiros (como sempre) e no episódio chegavam a cidade 3 irmãos. Eles eram 'forasteiros' e já começaram fazendo compras no mercadinho e querendo fazer fiado. Os donos, meio sem jeito, disseram que ficaria difícil e um deles largou um vaso de cristal no chão, como se fosse um acidente e os donos comprenderam a insinuação. Eles disseram que pagariam na sexta feira, quando chegasse uma ordem de pagamento que eles estavam esperando. Os donos do mercadinho concordaram, aparentemente acreditando. Saíram dali e foram numa marcenaria comprar madeiras. Fizeram a mesma promessa de pagar na sexta feira e depois revenderam a madeira pelo triplo do preço ( isso sem nem terem pago ainda). Em cada lugar que eles iam enganavam as pessoas que, por serem honestas, sempre aceitavam as desculpas deles, acreditavam em tudo que eles diziam. Até que perceberam que estavam sendo enganados. O reverendo, que a principio também acreditou e condenou qualquer tipo de violência contra eles, chamou-os para o culto de domingo e lá os homens da cidade ameaçaram e expulsaram os 3 e os seguiram até os limites da cidade, para intimidá-los. Assistindo ao seriado, pensei nisso, exatamente na ingenuidade daquelas pessoas, que moravam num povoado pequeno, onde todos se conheciam e se ajudavam mutuamente. Isso é comum no interior, onde há mais confiança e honestidade (pelo menos suponho que ainda é assim), mas perto de onde moro, municipíos como Antônio Carlos, Tijucas, São Pedro de Alcântara, Rancho Queimado, Santo Amaro já estão sendo 'atacados' em sua bonomia, sua credulidade e a violência tem grassado por lá. Normalmente tem havido muita violência nestes lugares, com roubos à casas e sequestros, bem como assalto à caixas eletrônicos bancários. Quem conhece esses pacatos lugares fica surpreso e indignado em saber que aquela gente tão simples e 'direita' é vítima dessas pessoas mal-intencionadas. No interior as pessoas deixam as roupas no varal a noite, saem para ir 'até ali' e nem fecham a casa, ajudam estranhos prestando informações, enfim, são pessoas que não vêem a maldade alheia por que não a conhecem. Agora isto mudou e até eles estão mais desconfiados. Não sei onde vi ou li ( acho que foi num jornalzinho de bairro de Biguaçu) que um homem narrava que tinha sofrido um acidente no interior do município, a noite, e saiu para pedir socorro na vizinhança, queria ligar para alguém, não me lembro ao certo, e ninguém quis ajudá-lo. Esse comportamento não é comum por lá, mas as pessoas já não sabem mais em que confiar e pensam que pode ser um 'golpe'.
E de golpes estamos ficando 'escolados' por que tem de todo tipo. Aquele simples na porta do banco ninguém mais cai, imagino. Mas tem na internet, por telefone, tem pessoas que usam crachás de empresas e conseguem entrar nas residências para assaltar e sequestrar. Tem de tudo.
Sou desconfiada por natureza e sempre repito que 'o seguro morreu de velho', mas leio tanta coisa e sei de tantos golpes e violência (embora deteste telejornais sensacionalistas e leituras afins), que já nem sei se minha desconfiança me ajuda em alguma coisa, por que uma hora a gente pode se surpreender.
Enfim, acho que sou mesmo 'do tempo que se amarrava cachorro com linguiça', como diz meu pai, e sinto saudade...

CRÔNICA POSTADA EM 14/11/2011

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